terça-feira, 28 de julho de 2009

ERVA DE SÃO JOÃO (HIPERICÃO)


Nos últimos tempos muito se tem falado acerca das propriedades desta erva no tratamento da depressão. A depressão é uma das doenças do nosso século e cada vez mais pessoas necessitam de medicação para conseguir ultrapassar a situação. E para além do uso de medicamentos é sugerida a utilização do hipericão no tratamento da doença, sem no entanto explicarem os cuidados que se devem ter ou as pessoas que não devem tomar hipericão. Pelo que se ouve é uma erva sem riscos e que pode ser tomada por todos.

Mas isso é falso. Todas as ervas ou plantas medicinais têm os seus riscos e não devem ser tomadas por todas as pessoas indiscriminadamente. O que se passa é que existe um vazio de legislação que não obriga à divulgação de possíveis efeitos adversos, contra-indicações, entre outros aspectos. A área das plantas medicinais é uma área com um enorme vazio e na qual é urgente trabalhar, no sentido de uma credibilização e segurança dos produtos que são vendidos.

É verdade que o Hipericão tem propriedades antidepressivas, por acaso com bons resultados, em tudo semelhantes aos obtidos com os fármacos antidepressivos existentes no mercado, com a vantagem do preço e dos poucos efeitos secundários. O grande problema do Hipericão são as interacções com outros fármacos que a pessoa possa tomar. Entre eles posso destacar as interacções com digitálicos (usados na insuficiência cardíaca, como é o caso da digoxina) e anticoncepcionais orais, havendo já registo de gravidezes indesejadas. Convém também alertar as pessoas de que existem dois tipos de hipericão e que apenas um deles está indicado para situações de depressão, sendo que o outro é utilizado em afecção hepatobiliares. O Hipericão com propriedades antidepressivas é o Hypericum perforatum e o com propriedades hepatobiliares é o Hipericão do Gerês ou Hypericum androsemum.

Seguidamente apresento um pequeno texto por mim elaborado em colaboração com uma colega, no âmbito da unidade curricular de plantas medicinais do curso de Mestrado Integrado em Ciências Farmacêuticas da Faculdade de Farmácia da Universidade de Coimbra.

“Desde sempre o Homem utilizou plantas no tratamento de doenças. Este conhecimento subsistiu até aos dias de hoje e o uso de plantas medicinais tem um peso considerável em muitas culturas. Actualmente, tem-se assistido a um interesse crescente pela utilização de algumas plantas medicinais um pouco por toda a parte dado o fácil acesso e a crença de que o seu uso é mais seguro e isento de riscos, relativamente aos medicamentos sintéticos.

No mercado estão disponíveis plantas medicinais na forma de suplementos não regulamentados e não sujeitos ao mesmo controlo que os medicamentos sintéticos (Anon, 2002 citado por Chavez et al, 2006). A sua introdução nos países mais desenvolvidos levou a que frequentemente o seu uso seja concomitante com medicamentos e nem sempre os consumidores informam o médico ou o farmacêutico (Izzo et al; 2002; Singh, 2005). A determinação de interacção entre as plantas contidas nestes suplementos e os medicamentos é limitada (Anon, 2002 citado por Chavez et al, 2006), não havendo informações detalhadas acerca dos seus constituintes (Venkataramana et al, 2005).

Apesar das lacunas, nos últimos anos têm surgido alguns estudos sobre as interacções entre plantas medicinais e alguns fármacos. Uma dessas plantas é o hipericão (Hypericum perforatum), planta herbácea perene, largamente difundida na Europa, Ásia, África do Norte e Estados Unidos da América, conhecida popularmente como “Erva de São João”, estando incluída na Farmacopeia Europeia desde 1999. Tem sido utilizada desde a antiguidade como cicatrizante, diurético, antibiótico, antiviral e antidepressivo (Bilia, 2002; Cunha 2005).

Esta última propriedade é a responsável pela actual popularidade da planta, dado que se reconhece uma eficácia antidepressiva semelhante a muitos antidepressivos convencionais, no tratamento da depressão leve a moderada, e com menos efeitos adversos (Barnes 2002; Bilia et al, 2002). A actividade antidepressiva está relacionada com uma inibição inespecífica de recaptação da serotonina, noradrenalina, dopamina e ácido gama-aminobutírico (GABA) e com a afinidade para o receptor NMDA do glutamato (Bilia et al, 2002; Cunha, 2005).
Foram identificados vários grupos de compostos bioactivos no hipericão: fenilpropanos, glucósidos de flavonóides, as biflavonas, proantocianidinas oligoméricas, xantonas, ácidos fenólicos, óleos voláteis, esteróides e vitaminas (Bilia, 2002; Cunha 2005).

O hipericão é das plantas medicinais mais estudadas (eficácia, tolerância e segurança) e com mais interacções conhecidas (Singh, 2005; Costa e Oliveira, 2004). São conhecidas interacções com antiepiléticos, ciclosporinas, digoxina, antiretrovirais, contraceptivos orais, Inibidores selectivos de recaptação da serotonina, teofilina, varfarina (Barnes, 2002).
Focando a atenção na digoxina, trata-se de um digitálico, amplamente utilizado no tratamento da insuficiência cardíaca, também ele derivado de plantas (folhas da dedaleira).
Segundo Barnes, a toma de hipericão durante o tratamento com digoxina oral conduz à diminuição dos níveis plasmáticos desta última.

As interacções farmacocinéticas entre o hipericão e medicamentos convencionais relacionam-se com a modulação da enzima CYP3A4 e da glicoproteína-p intestinal, com importantes consequências farmacocinéticas. No caso da interacção entre a digoxina e o hipericão, as alterações na biodisponibilidade têm sido atribuídas à indução da glicoproteína-p intestinal (Chavez, et al 2006; Zhou et al 2007). Esta é expressa nas vilosidades dos enterócitos e é responsável pelo bombeamento para o lúmen intestinal de alguns fármacos, incluindo a digoxina, limitando assim a sua absorção.

A administração oral do hipericão durante 14 dias em voluntários saudáveis resultou numa expressão aumentada da glicoproteína-p intestinal (Durr et al, 2000 referido por Zhou 2007). Noutro estudo, a administração oral de hipericão (24 mg/dia de hiperforina – responsável pela actividade antidepressiva) durante 14 dias, durante os quais também foi administrada digoxina, observou-se redução nas concentrações plasmáticas de digoxina com diminuição de 25% da área sob a curva (ASC) e diminuição de 35% da concentração máxima (Cmáx) (Gurley et al, 2008). Neste último estudo, os resultados também sugerem que as alterações na biodisponibilidade da digoxina estão relacionadas com a dose de hiperforina, não se observando diferenças na biodisponibilidade com doses inferiores a 5 mg hiperforina/dia. No entanto, não foram incluídas no estudo como variáveis, os restantes componentes da planta.

Outras investigações também relacionam a duração do tratamento com as alterações farmacocinéticas, verificando-se resultados semelhantes aos já descritos apenas com doses repetidas superiores a 10 dias, não se verificando alterações com doses únicas (Johne, 1999 referido por Costa e Oliveira, 2004).

Os dados apresentados levam às seguintes orientações: os utentes que tomam hipericão devem ser questionados acerca de outros medicamentos que tomem e os utentes que já tomam digoxina (ou outro com interacção comprovada) devem ser informados para não iniciarem a toma de hipericão. Utentes que já estão a consumir digoxina e hipericão devem ser encaminhados para o médico assistente, sendo necessária a monitorização dos níveis de digoxina. Com o hipericão os níveis podem ser subterapêuticos, mas com sua suspensão podemos atingir níveis tóxicos, pelo que a suspensão do hipericão ou alterações nas dosagens da digoxina devem ser bem ponderadas (Barnes, 2002).

Esta revisão suporta a necessidade de conhecer não só as interacções entre medicamentos convencionais mas também estender esse conhecimento a plantas medicinais, que são utilizadas como se não representassem quaisquer riscos. É importante surgir nova regulamentação e as interacções já conhecidas devem ser divulgadas. “

Diogo Miguel Pereira Fernandes e Maria Manuela Antão Simão

BIBLIOGRAFIA

- BARNES, Jo, et al – Herb-medicine interactions: St. John’s wort (Hypericum perforatum). Royal Pharmaceutical Society of Great Britain (RPSGB). Setembro de 2002. [Consult. 27 Fev. 2009] Disponível em WWW: URL:http://www.rpsgb.org.uk/pdfs/scifactsheetstjwort.pdf.

- BILIA, Anna Rita, et al – St. John’s wort and depression Efficacy, safety and tolerability – an update. Life Sciences. ISSN 0024-3205. Vol. 70, nº 26 (Mai. 2002) 3077-3096.

- CHAVEZ, Mary L., et al – Evidence-based drug-herbal interactions. Life Sciences. ISSN 0024-3205. Vol. 78, nº 18 (Mar. 2006) 2146-2157.

- COSTA, Teresa; OLIVEIRA, Ana Elisa – Interações Farmacocinéticas entre as Plantas Medicinais Hypericum perforatum, Gingko biloba e Panax ginseng e fármacos Tradicionais. Acta Farmacêutica Bonaerense. ISSN 0326-2383. Vol. 23, nº 4 (2006) 567-578.

- CUNHA, A. Proença; et al – Farmacognosia e Fitoquímica. 1ª Ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2005. 670 p. ISBN: 972-31-1142-X

- GURLEY, Bill J., et al – Gauging the clinical significance of P-glycoprotein.mediated herb-drug interactions: Comparative effects of St. John’s wort, Echinacea, Clarithromycin and Rifampin on Digoxin pharmakocinetics. Molecular Nutrition & Food Research. ISSN 1613-4133. Vol. 52 (Jan. 2008) 772-779.

- IZZO, Angelo A., et al – Cardiovascular pharmacotherapy and herbal medicines: the risk of drug interaction. International Journal of Cardiology. ISSN 0167-5273. Vol. 98, nº 1 (Jan. 2005) 1-14.

- SINGH, Yadhu N. – Potencial for interaction of Kava and St. John’s wort with drugs. Journal of Ethnopharmacology. ISSN 0378-8741. Vol. 100, nº 1 e 2 (Ago. 2005) 108-113.

- VENKATARAMANAN, Raman, et al – In vitro and in vivo assessment of herb drug interactions. Life Sciences. ISSN 0024-3205. Vol. 78, nº 18 (Mar. 2006) 2015-2115.

- ZHOU, Shu-Feng, et al – Identification of drugs that interact with herbs in drug development. Drug Discovery Today. ISSN 1359-6446. Vol. 12, nº 15/16 (Ago. 2007) 664-673.

1 comentário:

Anónimo disse...

BOA NOITE , GOSTARIA DE UMA INFORMAÇAO SOBRE O HIPERICAO PERFORATUN COMEÇEI A TOMAR ALGUNS DIAS ATRAS PQ FALECEU UM IRMAO E ESTAVA ME SENTINDO MT DEPRESSIVA ENTENDE? MAIS GOSTARIA DE SABER QUE SE TEM ALGUM PROBLEMAS QUE POSSA SUURGIR PQ JA TOMO OUTROS MEDICAMENTOS PRA TIROIDE P PRESSAO ALTA E TB P DIABETES METEFORMINA 500MG E TB TOMO A NOITE VICTOZA APLICAVEL NA BARRIGA P ABAIXAR O NIVEL DA GLICOSE ENTENDE ? ESTOU ME SENTINDO BEM ATE O MOMENTO NAO SINTO NADA DE DIFRENTE TOMANDO ESSE MEDICAMENTO ,MAIS GOSTARIA DE UMA OPINIAO DE VCS OK ,, MT OBRIGADA NEUZA