Nos últimos tempos muito se tem falado acerca dos casos de cegueira do Hospital Santa Maria alegadamente provocados pela injecção do medicamento “Bevacizumab”, comercializado pela farmacêutica Suíça Roche sob o nome de Avastin®.
Em primeiro lugar importa referir que esse fármaco é utilizado em todo o mundo em patologias oculares com bons resultados, embora nunca tenha sido aprovado o seu uso para essa patologia, ou seja, toda a responsabilidade da sua utilização recaí sobre os médicos que o preferem. Convém relembrar que para um determinado fármaco poder ser utilizado numa determinada patologia tem de ser aprovado pelas autoridades competentes para tal e para isso necessita de uma série de ensaios clínicos que comprovem a sua eficácia e segurança no tratamento dessa patologia, sendo que a Roche nunca procurou fazer isso para os problemas oculares. O fármaco apenas é utilizado para problemas oncológicos.
Mas de uma coisa podemos ter a certeza, por ano os oftalmologistas usam milhares de doses deste fármaco em todo o mundo e nunca surgiram problemas, nem nunca a Roche se preocupou que o fizesse, pois estava a entrar dinheiro para os seus cofres. Tudo mudou em Fevereiro quando a empresa enviou uma circular em que se descartava da utilização do produto para uso ocular. Como que por artes mágicas isto aconteceu pouco tempo antes de a empresa fechar o negócio de aquisição de uma empresa de biotecnologia chamada Genentech, que por acaso tinha aprovado um medicamento com a mesma finalidade mas muito mais caro. Parece estranha esta posição da Roche, mas se podemos ganhar mais uns trocos é preferível e diga-se de passagem eles também nunca fizeram força para que o Avastin® fosse aprovado com essa finalidade, logo a sua posição é aceitável.
Como referi anteriormente a responsabilidade da administração do fármaco é do médico e todos os possíveis efeitos adversos devem ser comunicados aos doentes antes da administração. Se o médico achou que aquele fármaco era o melhor para o seu doente, juntamente com o doente assumiu o seu possível sucesso ou insucesso, sendo que de acordo com os dados existentes na comunidade médica de oftalmologia as probabilidades de sucesso são muito elevadas.
Surge agora a questão de poder haver algum problema com o lote do fármaco ou com as condições de assepsia durante o procedimento. Em relação ao lote é difícil que exista algum problema, uma vez que desse lote já foram utilizadas diversas embalagens e já foram efectuados diversos testes. Poderá sim ter havido algum problema com a ampola utilizada. Se o fármaco estava dentro do prazo de validade, se tinha sido armazenado nas condições estipuladas o laboratório tem responsabilidades na matéria, mas não tem qualquer responsabilidade na situação específica de cegueira. Ora vejamos a situação. Se existe algum problema com um determinado fármaco esse lote tem de ser retirado do mercado e o laboratório é sempre responsabilizado por essa alteração, com as devidas consequências, agora ele não pode ser responsabilizado por uma situação que ocorreu no uso do produto numa patologia para o qual ele não estava indicado. É uma situação um pouco complexa, mas o laboratório suíço já se demarcou muito bem de eventuais responsabilidades.
A situação de falta de assépsia é sempre uma hipótese e podemos estar na presença de uma situação de quebra de esterilidade do material utilizado e aí a responsabilidade é sempre do Hospital de Santa Maria ou da empresa que estiver encarregue do serviço de esterilização, ou em último caso ainda não ouvi ninguém dizer que a culpa é dos enfermeiros que estavam a auxiliar o procedimento. Como o enfermeiro é sempre o elo mais fraco e mais desprotegido até estou admirado de ainda nenhum ter sido atirado para o centro do ringue. Estou a ironizar, mas com o decorrer das investigações ainda poderá acontecer alguma coisa.
Temos também a hipótese de ter havido um engano ao nível dos serviços farmacêuticos do Hospital e o produto que foi fornecido não ser o devido. É sempre uma hipótese a considerar ainda que remota, dada a pequena percentagem de erros desse género que acontecem todos aos anos em todo o mundo.
Espero que esta situação seja bem investigada e que os culpados sejam responsabilizados independentemente da sua profissão ou estatuto. Todos aqueles que agiram mal nesta situação devem ser responsabilizados e não se desculpem com sabotagens porque essa não pega. Quem é que iria querer sabotar o tratamento daqueles doentes? Porquê uma sabotagem em Portugal se outros países usam muito mais esse produto? Porque não sabotarem um país muito menos desenvolvido? Qual o interesse de uma sabotagem? São muitas as perguntas, mas se essa hipótese está a ser equacionada a investigação tem de ser muito profunda e levantar todas as pedras desmontando todos os interesses instalados, que são enormes e com um peso muito grandes. Vamos ver se as autoridades têm a força suficiente.
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