sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

MAIS UMA GREVE NA ENFERMAGEM


Pois é, parece que hoje é dia de greve para os enfermeiros. Mas onde é que eles estão? A lutar parece que não… Já me esquecia, as greves não servem para lutar, nem para expormos as nossas posições. Apenas servem para números e apara aproveitarmos um fim-de-semana prolongado. Mais uma vez volto a referir esta situação. Porque é que as greves não são marcadas durante a semana? Porque é que são sempre ou à segunda ou à sexta? A resposta é óbvia. Já que apenas os números interessam, se fosse durante a semana ninguém aderia, mas como os que aderem acabam por ter um fim-de-semana prolongado e como nestas greves não é necessário lutar, todos ficam contentes e os números lá vão aparecendo.

Mas de que valem os números se as pessoas não souberem aquilo que se passa na enfermagem. De que vale ter 95% de adesão à greve se o próprio ministério não tem noção daquilo que se passa na enfermagem neste país. Não vale de nada e com a postura que está a ser adoptada pelos sindicatos não vamos a lado nenhum. É uma postura demasiado centrado para os enfermeiros funcionários públicos, deixando de fora todos os outros com contratos a termo certo ou sem termo, que neste momento representam alguns milhares.

Eu sou enfermeiro com contrato sem termo e não faço greve. Primeiro porque penso que as greves não levam alado nenhum, sobretudo numa profissão onde elas não se fazem sentir. Trabalho num serviço de internamento e nas greves o serviço que se faz é exactamente o mesmo, com os mesmos doentes, com as mesmas rotinas, com as mesmas entradas de novos doentes. Onde é que a greve se faz sentir? De que vale um número. Claro que nada, pois se a população não sente as greves e não sai prejudicada, elas não fazem sentido. Em segundo porque com os sindicatos que temos actualmente não dá vontade nenhuma de lutar, pois eles esquecem-se de que não temos uma enfermagem, temos várias e que temos de lutar por todos os enfermeiros e não apenas por uma percentagem que a cada dia que passa diminui.

Neste momento existem dois grandes problemas na enfermagem. Um deles é que existem vários tipos de enfermeiros. Temos os enfermeiros que trabalham 40 horas, que ganham apenas mais 25% pelas horas de qualidade (falamos de sábados, domingos, feriados, noites), que têm 22 ou 25 dias de férias e que têm um ordenado base de mais ou menos 1150 euros. Depois temos outros que trabalham as mesmas 40, nas mesmas condições e que ganham apenas cerca de 970 euros. Temos também aqueles que trabalham 40 horas e que ganham as horas de qualidade como a função pública. Depois temos outros que trabalham 35 horas e que ganham segundo a tabela da função pública. Por último temos os funcionários públicos, que trabalham entre a 30 a 35 horas, que têm entre 25 a 35 dias de férias, que ganham muito bem pelas horas de qualidade (por certas noites chegam a ganhar mais 200%).

Como é que com tantos tipos diferentes de enfermeiros pode existir alguma motivação. Mas será que a profissão é assim tão diferente ao longo do país para existir tanta desigualdade? Não deveríamos todos ter os mesmos direitos? Sem dúvida que sim, mas ninguém se preocupa com aqueles enfermeiros que só ganham 25% pelas horas de qualidade, que sempre trabalharam 40 horas, que em muitos locais trabalham 40 horas e ganham apenas 970 euros de ordenado base. A grande preocupação é apenas com os funcionários públicos, que estão mal habituados e assim querem continuar, sendo muito semelhantes a parasitas, que vivem à custa dos outros e cujo lema é fazer o menos possível. Enquanto não tivermos apenas um enfermagem a profissão não se une, pois de que vale ter uma carreira se eu continuo a trabalhar para um hospital empresa e eles oferecem o contrato que lhes apetecer? Não vale de nada. A carreira só é boa para aqueles que lá estão, já que todos os outros dificilmente lá vão chegar e todos sabemos muito bem que de acordo com a actual conjuntura mundial e nacional, temos a todo o custo de emagrecer a função pública e não de a engordar ainda mais. Já lá vai o tempo em que o estado dava garantias de uma vida, com regras muito distintivas em relação ao privado e com padrões de trabalho e produção muito baixos. Temos de abandonar esse caminho e apostar na optimização dos recursos, que estão muito mal distribuídos e mal habituados. Quem quiser ser funcionário público tem de provar que o merece e que desenvolve trabalho para isso.

O segundo grande problema da enfermagem é o número de enfermeiros que são ano após ano formados. Todos se preocupam com as suas carreiras, mas ninguém assume que existem milhares de desempregados, que todos os anos são formados cerca de 40% de enfermeiros a mais do que o necessário. Ninguém vê isto e este é sem dúvida um dos maiores problemas. A Ordem dos Enfermeiros, os Sindicatos, o Ministério da Ciência e do Ensino Superior e o Ministério da Saúde têm de debater este problema com urgência, uma vez que a chave para a resolução dos problemas da enfermagem está na redução do número de vagas nas escolas d enfermagem. O simples facto de haver enfermeiros em excesso não nos dá poder negocial, pois se eu reclamar e lutar pelos direitos posso ver o meu contrato não renovado e passado umas horas tenho logo outro colega recém-formado no meu lugar, se for preciso a ganhar menos do que eu ganhava. Os Hospitais fazem o que querem e como os enfermeiros querem trabalhar acabam por aceitar todo o tipo de contratos comprometendo seriamente o futuro da profissão. Qualquer dia estão a oferecer o ordenado mínimo e as pessoas aceitam…Não podemos chegar a esse ponto sem retorno.

É certo que há algum tempo atrás talvez houvesse falta de enfermeiros, ou melhor, os que havia estavam mal aproveitados e dava ideia de que havia falta. Pois bem pensou-se em resolver o problema e a solução encontrada foi aumentar as escolas de enfermagem, quer públicas quer privadas, e aumentar o número de vagas. Com isto houve a necessidade de contratar mais professores, de reformular instalações, de contratar mais funcionários e como é óbvio muitos desses novos contratados passaram para os quadros das instituições, ou seja, não podem ir para rua, logo para eles poderem trabalhar e ganharem os seus fantásticos ordenados têm de ter alunos, já que é das suas propinas que as instituições sobrevivem, logo para este grupo não interessa a diminuição do número de vagas, pois isso poria em risco o seu próprio emprego.

As mesmas pessoas que lutaram para que se criassem mais vagas têm que lutar agora para a sua diminuição. O futuro da profissão depende desta simples medida, que tem de ser encarada com coragem. De que vale ter uma Ordem se ela não opina sobre nada? De que vale ser sindicalizado se eles são inertes? Vamos tentar fazer alguma coisa pela enfermagem enquanto é tempo, mas este vai escasseando e mesmo que se tomem as medidas certas a situação vai demorar alguns anos até estabilizar.

http://www.ordemenfermeiros.pt/
http://www.sep.org.pt/
http://blog.comunidades.net/enfermeiroonline/
http://enfermeirosunidos.blogs.sapo.pt/
http://quiosque.aeiou.pt/gen.pl?p=stories&op=view&fokey=ae.stories/15621
http://ultimahora.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1365979

3 comentários:

Anónimo disse...

se não fez greve é porque esta contente com o seu salario e as suas condiçoes de trabalho, por isso não se queixe.....

Anónimo disse...

Primeiro que tudo parabéns pelo blog. revelas estar actualizado acerca de muitos aspectos e isso é fundamental para um blog...Muito bem Didi! :p
Não fiz greve desta última vez apenas porque não estava a trabalhar, mas se estivesse faria e apenas por um único motivo: progressão nas carreiras que, como sabes, estão congeladas há imenso tempo. É tempo de fazer uma revisão às mesmas e esta é, certamente, a melhor altura para reivindicar esse direito, uma vez que estamos próximos de uma época eleitoral. Agora é que devíamos sair com a força toda, fazer mais greves a meio da semana quebrando a produtividade, de forma a que tal mobilização se faça sentir.
Acredito que no teu serviço se realizem as mesmas actividades que num dia normal de trabalho, mas digo-te sinceramente que isso só acontece porque "vocês" deixam. São apenas obrigados a realizar cuidados mínimos e,entenda-se cuidados mínimos que não ponham em risco a vida do utente. Acho que têm de ter mais cuidado com isso...Tu não tens de te preocupar muito com isso pois vais deixar de ser enfermeiro em breve, portanto... :) abraço do sakra

Anónimo disse...

A pensar assim é que não vamos a lado nenhum!
Já entendemos que na enfermagem tudo acontece muito devagar contudo essa atitude tb não é a melhor. O objectivo a longo prazo é anular injustiças na profissão e começa por uma carreira única... melhoria das condições de acesso à carreira, etc... e sei que tudo demora demasiado tempo mas daí a deixar de fazer greve e provocar desunião isso não é muito bom!
Leia a definição de cuidados mínimos e tenha coragem para marcar a diferença.