terça-feira, 16 de setembro de 2008

NOTAS DE INGRESSO NO ENSINO SUPERIOR


O momento há muito aguardado por muitos alunos portugueses chegou e a partir de hoje inicia-se o processo de matrículas e já para a próxima semana começam as aulas, que vão marcar um ponto de viragem nas suas vidas. Pelo menos é isso que se pretende, se bem que em muitos casos o nosso Ensino Superior mais parece uma continuação no Secundário, tal a forma como as aulas são encaradas por professores e alunos.

Nesta primeira fase de candidaturas temos mais 44336 alunos no Ensino Superior. Se verificarmos que os que concorreram foram 53062, chegamos à conclusão que ficaram de fora apenas 8726 alunos, sendo que desses cerca de 5000 ainda vão ter oportunidade de entrarem na segunda fase de acesso. Estes números revelam um aumento de concorrentes, o que é bastante bom para o nosso país, sinal que as pessoas cada vez apostam na sua formação, se bem que em muitos casos isso constitui um tremendo sacrifício dadas as enormes despesas de ingressar no Ensino Superior. O nosso Governo ainda não consegue ter uma acção social escolar adequada e existe uma má distribuição dos apoios. Devem-se construir mais camas para os estudantes e melhorar as condições das cantinas e espaços de estudo e de lazer. Há muito a afazer nas nossas instituições, mas o que se assiste é a uma grande preocupação com o dinheiro para pagar aos professores e os alunos acabam por ser esquecidos.

Mais uma vez assistimos a um grande número de vagas para os cursos de Direito. O curso de Direito na Faculdade de Direito da Universidade Lisboa foi o que disponibilizou mais vagas, sendo que as 510 disponibilizadas foram todas preenchidas. A seguir vem também o curso de Direito da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra com 330 lugares preenchidos, sendo que a seguir ao Direito encontramos os cursos de Enfermagem, que em Coimbra disponibilizavam 320 vagas só depois temos Medicina, com 253 vagas em Coimbra, 245 no Porto e cerca de 5830 em Lisboa a dividir pela Universidade Nova e pela Clássica. Ou seja, verificamos que cursos tremendamente esgotados como Enfermagem e Direito continuam a ser dos que mais vagas disponibilizam. Esta situação deve ser invertida, já que o número de desempregados nestes dois sectores aumenta ano após ano e aparece que ninguém quer ver essa situação. O mundo do Direito é muito fechado e são necessários muitos conhecimentos ou grandes notas para se entrar logo nele e em relação á enfermagem o número de enfermeiros formados é substancialmente superior aos que se vão reformando e à capacidade de empregabilidade dos nossos Hospitais. Todos sabemos que existem défices, mas dada a conjuntura económica é muito difícil para os Hospitais fazerem mais contratações e com isto muitos acabam por ficar no desemprego.

No que diz respeito a médias, o curso de Medicina continua a ser aquele com as notas de entrada mais altas. Não restam dúvidas de que neste momento é o curso mais elitista das nossas Universidades. Existem alunos que passam a vida escolar a prepararem-se para entrar em Medicina. Gastam-se verdadeiras fortunas em explicações e colégios particulares, onde se pensa que os filhos possam vir a obter uma melhor média. Muitos alunos concluem o secundário e ficam dois ou três anos a tentarem obter melhores médias só para conseguirem ingressar no curso de Medicina. A ideia que passa para a sociedade é que a Medicina é neste momento uma das profissões mais bem pagas e que o emprego abunda, logo as pessoas incutem desde muito cedo nos seus filhos que eles têm de ir para Medicina, que aquilo é que é bom, que lá se ganha muito dinheiro, que o estatuto social é elevado, entre muitas coisas. E isto é tudo verdade e enquanto não se impedir que um médico ganhe 2500 euros num só dia esta situação não é passível de se inverter e aqui surge-me uma pequena dúvida. Será que as médias mais altas significam que esses alunos são aqueles com o melhor perfil para serem médicos? Não me aprece, mas actualmente não é isso que conta. A única coisa que importa é o dinheiro e as vocações ficam para segundo plano e esse é um dos motivos pelo qual a saúde está da maneira que está e que por vezes o atendimento nos Hospitais deixa muito a desejar, mas isso são outras guerras.

A média de Medicina no Porto foi a mais alta, totalizando os 185.2 valores. A seguir temos também os cursos de Medicina no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar também no Porto com 183.7, na Universidade do Minho com 182.7 e Coimbra com 181.7. Tirando os cursos de Medicina, é de salientar que o curso de Arquitectura na Universidade do Porto totalizou os 180 valores e o curso de Engenharia Biomédica na Universidade do Minho com 181.6. Deve ser o facto da palavra “médica” estar incluída no curso que atrai tanta gente. Mas o que se calhar as pessoas não sabem é que o curso tem pouco a ver com Medicina e não é uma porta aberta para uma transição para as Faculdades de Medicina. Devem ter muita atenção à palavra Engenharia que nos remete para o essencial do curso, que é a formação de técnicos altamente especializados na criação e produção de aparelhos utilizados na actividade médica. É uma profissão muito interessante e com muito futuro, mas não se pense que está assim tão próxima da Medicina.

Pela negativa temos os cursos de Engenharia Electrotécnica e de Computadores no Instituto Politécnico de Setúbal com 95 valores e o curso de Educação Básica no Instituto Politécnico de Bragança com 99.6 valores. Estes números causam-me alguma estranheza pelo facto de continuarem a existir alunos a entrar no Ensino Superior com notas negativas. Não me venham dizer que um 9.5 é 10 porque sabemos bem que não é. Existem até muitos professores universitários que quando os alunos têm 9.5 nos exames, mas facilmente arranjam maneira de lhes dar o 9 do que o 10, apesar de os arredondamentos indicarem que o 9.5 é 10. Este facto não deixa de ser estranho e apesar da Matemática não deixa de ser uma nota negativa, que com uma ajudinha se transforma em nota positiva. Para algumas coisas existem os arredondamentos, mas para outras já não. Esta dualidade de critérios é sempre inquietante e enquanto isto assim acontecer a nossa sociedade não vai para afrente. Temos de apostar na equidade e que esta seja transversal às diversas áreas da nossa sociedade.

Por último vou falar acerca dos cursos para os quais só entraram 3 ou 4 alunos e que de certeza não vão ter condições para funcionarem. É que sem alunos não é possível termos professores para dar aulas. E isto só quer dizer duas coisas. Ou a qualidade do ensino é muito má nesses locais, ou então criaram-se escolas e mais escolas e agora não temos matéria-prima para as encher. Eu não sou contra o facto de as cidades do Interior terem Ensino Politécnico, o que sou contra é ao facto de ai se criarem cursos a mais. Devemos dimensionar estes espaços tendo em conta a realidade nacional e de cada região. Não podemos desenhar um complexo em Bragança ou Castelo Branco da mesma forma que o fazemos para Aveiro, Coimbra ou Leiria. Devemos sim apostar na qualidade da formação no interior e não na quantidade. Só pela qualidade é que as pessoas preferem esses locais e isso faz com que existam muitos cursos com poucos alunos, como é o caso do curso de Restauração e Catering na Escola Superior de Turismo e Telecomunicações de Seia, que pertence ao Instituto Politécnico da Guarda, que não teve qualquer aluno a concorrer para esse curso, o que é humilhante e difícil de explicar, mas eu gostava de ouvir os nossos governantes falarem destes casos. Outro caso é o do curso de Informática em regime pós-laboral da escola Superior de tecnologia do Instituto Politécnico do Cávado e do Ave em que entraram apenas 2 estudantes, mas nenhum deles pelo regime geral de acesso, logo algo vai muito mal para estas bandas. Mas os exemplos são muitos e posso dar o exemplo do Instituto Politécnico de Bragança em que cursos como Engenharia Florestal tiveram 2 colocados, Engenharia Zootécnica com 3 colocados, Engenharia Agronómica também com 3, entre outros. É de salientar que neste mesmo instituto, apenas ficaram sem qualquer vaga os cursos de Desporto, Gestão, Engenharia Biomédica, Engenharia de Energias Renováveis e Solicitadoria, num total de 34 cursos.

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